CULTURA - O Mosteiro de Lorvão, breves apontamentos da sua história*
O Mosteiro de Santa Maria de Lorvão é
um dos cenóbios mais antigos de Portugal, e um dos mais importantes da região
de Coimbra. Situado no concelho de Penacova, a data exacta da sua fundação
permanece incerta. Os historiadores estabelecem balizas cronológicas amplas, já
que consideram que a sua fundação ocorreu entre os finais do século VI e o
início do século IX. De facto, o documento mais antigo de que dispomos
mencionando o Mosteiro de Lorvão data de 878, período de reconquista cristã, em que Afonso III das
Astúrias delineou a conquista da cidade de Coimbra.
O Mosteiro de Lorvão desempenhará
neste período um importante papel no povoamento da região, assumindo-se como um
baluarte de fé na luta contra os invasores muçulmanos, ao mesmo tempo que
proporcionava condições favoráveis à fixação das gentes e aproveitamento
económico do espaço. Durante o reinado de D. Sancho I (1185-1211), e sobretudo
devido à acção de D. Teresa e D Sancha, filhas do monarca “povoador”, o cenóbio
foi palco de uma profunda reforma, que entre outras alterações de fundo o
tornou no primeiro mosteiro cisterciense feminino existente em Portugal. Com as
monjas cistercienses veio também a ordem de S. Bernardo que reformara a de S.
Bento. O mosteiro passou a ser a casa de jovens mulheres, portuguesas e estrangeiras,
pertencentes a famílias nobres, que escolheram Lorvão para abraçar a sua
vocação religiosa.
Os túmulos das infantas beatas,
trabalhados a prata pelo ourives portuense Manuel Cordeiro da Silva por volta
de 1715, foram colocados na capela-mor do cenóbio lorvanense e atestam a
importância que as netas e Afonso Henriques tiveram na instalação da variante
feminina da ordem de Cister em Portugal.
Ficaram célebres os manuscritos
medievais produzidos no Mosteiro de Lorvão. O seu scriptorium produziu algumas
das mais belas iluminuras portuguesas da época. O Livro das Aves (1184) e o
Apocalipse de Lorvão (1189), são de uma sumptuosidade desarmante, constituindo fontes
históricas de enorme riqueza.
Casa de religiosidade e de
introspeção, nem sempre a concórdia habitou dentro dos limites do mosteiro. O momento
de eleição de uma nova Abadessa era sempre propício a conflito. Ficou célebre a
eleição da Abadessa Filipa d´Eça em 1537, onde segundo se conta as monjas terão
chegado a vias de facto. Um outro momento de grande instabilidade para o
mosteiro, agora provocado por motivações externas, prendeu-se com o período das
invasões francesas que o privaram de parte do seu espólio artístico. A Reforma
Liberal primeiro, e Joaquim Gomes Aguiar depois, abalaram os alicerces das
ordens religiosas em Portugal acelerando o seu epílogo.
Desta forma, o património do mosteiro
que sobreviveu aos homens de Napoleão, foi vituperado e a sua riqueza espartilhada.
Tal foi a violência e a sede de expropriação de bens utilizada que as últimas
monjas do mosteiro viveram num ambiente de miséria, sobrevivendo graças à
piedade da população local. Longe iam os tempos, em que o mosteiro era uma instituição
poderosa, e as suas cenobitas controlavam os destinos da terra. O foral
concedido ao burgo de Lorvão pela abadessa Constança Soares a 26 de Abril de
1298, mais não é do que a memória de um tempo olvido, de um tempo embebecido em
religiosidade.
Nuno Oliveira, historiador, originalmente publicado no Diário de Coimbra
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