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PATRIMÓNIO - A arte de (bem) trabalhar o salgueiro


Desde os cinco anos de idade que Palmira Lopes, natural de Ronqueira mas residente em Penacova, trabalha a madeira de salgueiro, transformando-a em moinhos, presépios, rocas, barcas ou palmeiras. Aprendeu com o pai, que era canastreiro e se dedicava aos palitos de flor e outras peças no Verão. «Mas foi a minha avó que começou a fazer para sustentar a família», explica. A arte nasceu entre as freiras do Mosteiro do Lorvão no século XVIII e estendeu-se mais tarde às famílias da zona.

Palmira Lopes executa palitos e as mais variadas peças de decoração em madeira de salgueiro e tem uma particularidade. Conta a sua vida e responde a perguntas acerca dela sempre em verso. «São 31 versos mas o senhor desculpe, deixei-os em casa». Nada que não se possa, no entanto, contar em prosa. «Foi a minha avó Ernestina que teve a ideia, na família, de começar a trabalhar a madeira assim, porque elas eram sete irmãs e só ela casou, aos 48 anos. Era preciso sustentar a família. Dela, passou para o meu pai».

Naquele tempo, a arte só se vendia na zona de Penacova. «O meu pai era canastreiro e de Verão é que fazia estas peças em salgueiro para vender. Cortava-se a madeira em Janeiro e secava-se com o bom tempo. Tinha fama na zona e vendia bem».

Bem cedo, Palmira começou a ajudar o pai: «Aos cinco anos. Eu não queria, chorava mas fui obrigada. Tinha de fazer, que remédio».


Como as mãos ficam ásperas no trabalho do campo, Palmira amanhava as terras no sábado e na segunda-feira e trabalhava a madeira nos outros dias. «Ainda hoje faço isso, para ter as mãos em condições».

Palmira não tem muito boas recordações do pai. «Abandonou-nos mas antes disso, mesmo no trabalho, estava sempre a gritar e não nos queria ensinar. Eu aprendi sozinha a ver como ele fazia».

Aos 15 anos, Palmira executava já as palmeiras ou os moinhos que executa hoje. Vendia em casa e nos cafés Turismo e Beirão, em Penacova. «Os de Lorvão compravam-me muita coisa e queriam que eu dissesse que era de Lorvão mas eu não dizia».


Palmira pega em diversos paus de salgueiro e numa navalha própria e começa a executar as folhas de uma palmeira. Raspa bem a madeira branca com uma navalha fininha. Depois, por debaixo do seu banco, exibe outras. «São várias navalhas para cortar bem e também são diferentes paus. Veja agora». Pega num pedaço de madeira e executa com uma rapidez incrível um palito de flor. Surgem rapidamente as pintinhas e os ziguezagues.

«E o telhado do presépio, quer ver como eu faço?» Volta a raspar, desta vez com uma navalha fina encaracola um pedacinho de salgueiro, retira-o do pau e cola-o no presépio. «Eu abro a madeira à maneira que eu quero e devagarinho para não quebrar. Este devia ser mais macio. O pau tem que ser macio para as peças mais trabalhadas mas não interessa, é para o senhor ter uma ideia, não é?».


A maioria das peças demoram horas a fazer. «Este molhe de palitos demora hora e meia a fazer e custa um euro. Quem diz isto diz tudo, não é?».

A filha de Palmira Lopes começou a trabalhar com ela. Para que esta aprendesse as peças mais difíceis, passou para ela os moinhos, as canetas e esferográficas. «Ela aos 15 anos queria namorar. Eu disse-lhe que para namorar tinha de me ajudar. E ela: “Mãe, vendeste a minha peça, quero cá dinheiro..."».

Palmira não trabalha apenas rapidamente e com precisão. Está feliz. «É uma felicidade para mim poder sair de casa e vir até aqui à Feira de Artesanato de Coimbra. Em casa tenho uma televisão à frente e dá-me dor de cabeça. Aqui já conheço toda a gente e conhecem-me a mim. Até a cabeça fica mais leve».

Em Poiares, ainda deu um curso para substituir uma colega de profissão que adoeceu. «Andaram lá para receber o dinheirinho e não pegaram na arte. É assim».

Nuno Ferreira | Café Portugal