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FLORESTA - Eucalipto. Licenças permitem plantar (ainda mais) até ao final de 2019


Os especialistas acreditam que a realidade será bem mais dura, do ponto de vista da área que o eucalipto ocupa em Portugal. No último inventário - datado de fevereiro de 2013 - era esta a espécie que ocupava já a maior fatia da superfície florestal: 812 mil hectares, o equivalente a 26% da floresta. E isso foi muito antes de se tornar um assunto na ordem do dia, na sequência dos incêndios de junho e de outubro de 2017, em que o eucalipto terá sido a árvore explosiva. Entre os grandes fogos da região centro (Pedrógão Grande, em junho, e Oliveira do Hospital, em outubro) o atual governo fez aprovar a Lei 77/2017, de 17 de agosto, que proíbe a plantação de eucaliptos em Portugal. Mas a legislação só passou à prática a 1 de janeiro de 2018, quando entrou em vigor.

"As autorizações de plantação existentes decorrem da aplicação da anterior legislação (Decreto-Lei 96/2013, de 19 de julho), da autoria do anterior executivo, que liberalizou a plantação de eucaliptos", disse ao DN o ministro da Agricultura, Capoulas Santos. As autorizações em causa correspondem a pedidos que deram entrada durante o período de vigência do Decreto-Lei 96/2013, sendo válidas por dois anos. Ou seja, "com a anterior lei em vigor, foi possível obter autorizações de plantação até 31 de dezembro de 2017", adianta o governante. O que quer dizer que as plantações "poderão ser instaladas até 31 de dezembro de 2019, data em que caducam as últimas licenças".

De resto, Capoulas Santos sublinha que "a posição do atual executivo sobre esta matéria é muito clara: por iniciativa deste governo, desde 1 de janeiro de 2018 que é proibido plantar eucaliptos em Portugal".

A juntar às plantações - perfeitamente legais, como se vê - há a explosiva rebentação de novas árvores da espécie, na sequência dos incêndios de 2017. Quem percorre o IC8 e atravessa a vasta região do pinhal interior norte, dizimada pelos incêndios de 17 de junho desse ano, percebe que a espécie cresceu e multiplicou-se. Os montes e vales estão de novo verdes, aquilo a que o pintor João "Viola" chama "um barril de pólvora", como sublinhou ao DN. A aldeia de Nodeirinho, onde mora, está de novo cercada por um manto de eucaliptal, não obstante o trabalho da Associação Raiz Permanente, que se dedicou a arrancar muitos dos eucaliptos que entretanto rebentavam. João "Viola" tem vindo a publicar nas redes sociais vários vídeos alertando para o perigo e risco de incêndio que tanto eucalipto representa para aquela região e para o país.

Insólito é o caso do Pinhal de Leiria - também destruído em mais de 80%, no fogo de 15 de outubro de 2017 - onde o eucalipto não tinha lugar, e agora se faz notar. Na reportagem publicada pelo DN em outubro passadoum ano depois do fogo, o engenheiro florestal Hugo Simões apontava a presença de eucalipto em vários locais, a par daquela que é considerada a maior planta invasora - a acácia. Uma e outra espécie foram ocupando rapidamente todas as clareiras do Pinhal nos últimos meses.

Uma espécie de rendimento fácil (e rápido)

Joaquim Sande Silva é um dos especialistas que mais se tem dedicado a esta temática, analisando "a expansão que a espécie tem tido em todo o território nacional, o que é bem visível nos últimos inventários florestais". O professor da Escola Superior Agrária de Coimbra (ESAC), que integrou a comissão técnica independente de análise aos incêndios de junho de 2017, sublinhava, um ano depois, que as árvores que ficam de pé não representam grande risco de incêndio. Mas a história é outra quando se fala da regeneração dos eucaliptosrebentaram com muito mais vigor, depois do fogo, o que significa que, "daqui a um ou dois anos, é como se não se tivesse passado nada", declarava em junho passado à agência Lusa.

Nesta semana, em declarações ao DN, Joaquim Sande Silva sublinhou que "o motor desta expansão tem sido a procura de material lenhoso e sobretudo o facto de os pequenos proprietários serem muito atraídos pela obtenção relativamente rápida de rendimento, com o eucalipto". Na verdade, trata-se de uma árvore rentável em dez anos, e que além disso exige muito poucos cuidados, ao contrário de outras espécies.

E mesmo depois do fogo, tem uma grande capacidade de regeneração. Cerca de 90% das árvores regeneram, às quais se juntam plantas jovens de eucalipto "que terão começado a despontar através de sementeira". Quando passa um fogo, os frutos do eucalipto abrem e libertam as sementes, sendo "uma espécie de sementeira natural, e contribuem para aumentar a densidade dos eucaliptos" que havia no terreno, explica um dos 12 peritos da comissão técnica independente.
Joaquim Sande Silva não tem dúvidas de que "a espécie traz uma série de problemas devido à forma como é cultivada". No entanto, o especialista coloca a questão de outra forma: "Tudo depende daquilo que a sociedade quer da paisagem, da floresta e da natureza. Por isso tenho insistido na ideia de que era fundamental que o Estado perguntasse à sociedade o que quer da floresta. E não seria assim tão difícil fazê-lo, qualquer empresa de sondagens estaria apta para isso". Aliás, o professor entende que essa é a pedra basilar de toda esta discussão, ou seja, a forma como a sociedade deve pagar a conservação da floresta. Sande Silva recorda que já foi criado um Fundo Florestal, "mas foi completamente subvertido".

"O dramático é que isto é irreversível", afirma Joaquim Sande Silva. Uma parte importante dos eucaliptais em Portugal "está abandonada", e seria uma tarefa hercúlea avançar com maquinaria que arrancasse boa parte dessa plantação, pois que teoricamente seria possível reflorestar com espécies "mais apetecíveis" para o ecossistema.

Numa floresta em que o eucalipto é rei enquanto espécie arbórea, segue-se depois o sobreiro (737 mil hectares; 23% da floresta) e o pinheirobravo (714 mil hectares; 23%). A área ocupada por espécies resinosas corresponde a 31% da floresta portuguesa, sendo a restante (69%) ocupada por espécies folhosas.

Paula Sofia Luz – Diário de Noticias

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