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CULTURA - "Os Feriados em Portugal, Tempos de memória e de sociabilidade", o novo livro de Luís Reis Torgal

O Historiador Luís Reis Torgal escolheu a Sala Sá de Miranda (Casa Municipal da Cultura de Coimbra), para a apresentação do seu mais recente livro "Feriados em Portugal. Tempos de memória e de sociabilidade". A sessão decorre no próximo dia 02 de outubro, pelas 18h00 e nela será proferida uma conferência pelo historiador, de homenagem ao Senhor Doutor Luís Oliveira Andrade, sobre o tema «Feriados em Portugal. História e polémica».
A apresentação da obra, antecede em poucos dias a última celebração do feriado de 5 de Outubro, já que será abolido por iniciativa do governo em 2013.


Fique a conhecer um pouco do que será o rico e interessante conteúdo da obra, através de uma abordagem feita pelo autor em novembro do ano passado, no Diário de Notícias.
O 1.º de Dezembro é o feriado civil mais antigo: sobreviveu à I República austera em festividades, ao Estado Novo que só recuperou os "dias santos" em 1952 e à chegada da democracia, que nunca aboliu feriados mas acrescentou vários ao calendário.
Menos de uma semana após a revolução republicana de 1910, um decreto acabou com os feriados religiosos e institui apenas cinco dias de 'folga nacional': o 1.º de Janeiro (transformado em Dia da Fraternidade Universal), o 31 de Janeiro (data da revolta republicana no Porto, em 1891), o 5 de Outubro (Dia da República), o 1.º de Dezembro (Dia da Independência e da Bandeira) e o 25 de Dezembro (que passou a Dia da Família).
O mesmo decreto permitia aos municípios escolherem um dia de celebração local, estando aqui a origem dos feriados municipais.
Os republicanos só aceitavam uma celebração civil vinda da monarquia: o 1.º de Dezembro, que celebra a restauração da Independência em relação a Espanha em 1640.
Este é um feriado nascido na segunda metade do século XIX, pela mão da então Comissão Nacional 1.º de Dezembro, mais tarde Sociedade Histórica da Independência Nacional, criada em 1861 como reacção "a um movimento iberista", explica o historiador Luís Reis Torgal, professor catedrático da Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra, que está a preparar um livro sobre os feriados em Portugal, na sequência do trabalho iniciado por Luís Oliveira Andrade, entretanto falecido, para uma tese de doutoramento.
A origem dos feriados, explica Reis Torgal, remonta ao século XIX e à Monarquia Constitucional: "A realeza criava dias para celebrar um acontecimento qualquer", tendo os feriados sido instituídos já no final do regime.
Com a chegada da República, reduzem-se assim a cinco os feriados nacionais. Mas esta austeridade durou pouco e, lentamente, foram-se acrescentando dias de ócio ao calendário, até aos actuais 13 (seis civis e sete religiosos).
Logo em 1912, os republicanos criam o 3 de Maio, para celebrar a descoberta do Brasil. E em 1929, já sob a ditadura que levaria ao Estado Novo, o feriado municipal de Lisboa passa a nacional, nascendo aqui o 10 de Junho, que começou por ser o Dia de Camões e Portugal, passou a Dia de Camões, de Portugal e da Raça em 1944 e é, desde, 1978, o Dia de Portugal, de Camões e das Comunidades.
"Curiosamente", sublinha Reis Torgal, o Estado Novo demorou décadas a mexer nos feriados e, em particular, a recuperar os religiosos, os "dias santos". Só o faz depois da assinatura da Concordata com a Santa Sé, em 1940, e o Ano Santo de 1951.
Mesmo o feriado da Imaculada Conceição, que é formalizado em 1948, é celebrado durante anos como o Dia da Consagração de Portugal a Nossa Senhora.
"Não se celebrava o dogma. O salazarismo manteve sempre a separação entre Estado e Igreja, apesar da grande influência da Igreja. Os feriados eram sempre celebrações cívicas", afirma o historiador.
Em 1952, Salazar acaba com o 31 de Janeiro e o 3 de Maio e junta três festas católicas à Imaculada Conceição (8 de Dezembro), ao Natal e ao 1.º de Janeiro, assim nascendo o Corpo de Deus (móvel), o 15 de Agosto (Assunção de Maria) e o Dia de Todos os Santos (1 de Novembro).
Os responsáveis pelo 25 de Abril de 1974 foram ainda mais rápidos do que os primeiros republicanos e, dois dias depois da Revolução dos Cravos, a data do golpe militar já era feriado, assim como o 1.º de Maio, o Dia do Trabalhador.
A democracia fez nascer mais dois feriados nacionais religiosos: a Sexta-feira Santa (em 1976) e o Domingo de Páscoa (em 2003).
Religiosos ou civis, republicanos ou monárquicos, os feriados mantêm uma característica: foram sempre associados a dias de ócio, sem trabalho, segundo Reis Torgal.

Recorde também a opinião do historiador Luis Reis Torgal, acerca da abolição do feriado de 5 de Outubro, publicada em novembro último, pela Diocese de Coimbra.

O historiador Luís Reis Torgal considera que a implantação da República em 1910 foi “apenas uma mudança de regime”, não de “sistema político”, como fez o 25 de Abril, defendendo a abolição do feriado do 5 de Outubro.

O 5 de Outubro foi apenas uma mudança de regime, não de sistema político. Mudança de sistema político é sim, ou pretende ser, o 25 de Abril, porque passámos de um sistema ditatorial, autoritário, se não totalitário, para um regime democrático", disse o professor catedrático da Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra.
Reis Torgal sublinhou que a monarquia que caiu em 1910 já era constitucional, parlamentar: “Não se pode dizer que o 5 de Outubro terminou com a ditadura. Não vejo grande necessidade em manter o 5 de Outubro”, insistiu.
Já “o 25 de Abril é verdadeiramente histórico. É o primeiro momento em que verdadeiramente se sai de um sistema ditatorial para um democrático", pelo que "de modo nenhum se deve eliminar” este feriado, acrescentou.
O mesmo acontece, para Reis Torgal, com o 10 de Junho, Dia de Portugal, Camões e das Comunidades.
Ninguém liga ao 10 de Junho, mas devia. Defendo a necessidade de relançamento da identidade nacional, mais do que nunca. É verdade que tem associado um peso reaccionário, a ideia da raça, mas era importante reanimá-lo, estamos a perder a identidade nacional. Devíamos refazer o 10 de Junho republicano”, considerou, explicando que este é um feriado que nasceu com a I República.
Deve manter-se um dia que marque esta questão da identidade nacional frente à lógica em que vivemos hoje, em que perdemos cada vez mais o sentido da independência”, insistiu, para acrescentar que porém basta um dia para isso e que o 1.º de Dezembro pode ser um dos feriados nacionais a eliminar.
O 1.º de Dezembro, de alguma maneira, tem certa correspondência com o 10 de Junho. Mas como Dia da Independência [restaurada em 1640] já não diz nada. O que nos diz a independência em relação a Espanha?”, questionou, em declarações à Lusa.
Também o 1.º de Maio, Dia do Trabalhador, “deve manter-se” na opinião do historiador, até pela sua dimensão internacional e também para “não se perder a ideia da luta dos trabalhadores”.
Por outro lado, Reis Torgal defende que “há uma série de feriados religiosos” para os quais não vê “explicação nenhuma”, dando o exemplo do dia da Imaculada Conceição (8 de Dezembro), relacionado com “um dogma que além de não dizer muito a ninguém, é também muito debatido no seio da própria Igreja”.
Era mais lógico que houvesse a quinta-feira da Ascensão, um dia de grande significado popular”, diz o historiador, que está a preparar um livro sobre os feriados em Portugal, explicando que se trata do dia conhecido como o Dia da Espiga e que é hoje o feriado em muitos municípios do país, sobretudo a Sul do Tejo, celebrando-se 40 dias após a Páscoa.
O Governo vai acabar com quatro feriados, dois civis e dois católicos, com o objectivo de aumentar a produtividade, questão que será debatida na segunda-feira numa reunião de concertação social.
Os dois feriados religiosos a eliminar resultarão de um acordo com a Igreja Católica.