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OPINIÃO - A tragédia dos comuns

O actual momento que se vive ao nível europeu reflecte o drama da classe dirigente europeia: a incompreensão da diferença entre Política e sentido de Estado. Se a primeira é caracterizada pelo acto de discutir a “polis” para atingir o bem comum pelos representantes da sociedade, a segunda é a consciência de que todos os actos políticos realizados devem ser somente e só dirigidos ao bem comum dessa sociedade, independentemente da sua compreensão ou popularidade. As duas não estão sempre associadas, pelo paradoxo democrático. O objectivo máximo da política é conseguir o poder através do voto, e para conseguir esse voto é necessário conseguir prover todas as necessidades da população. A tragédia estará quando as necessidades da população são distorcidas, pela classe dirigente, pela informação, ou quando as necessidades da maioria não vão de encontro à da totalidade da população. A sua consequência máxima é a manutenção do poder pelo voto, independentemente da procura pelo bem comum.

O que aconteceu com o Reino Unido foi um grande exemplo da diferença entre Política e sentido de Estado. Na altura de eleições, o ano passado, uma das promessas de Cameron foi precisamente realizar um referendo sobre a permanência do Reino Unido na União Europeia. Cameron venceu com maioria, realizou o referendo e defendeu a permanência. Se Cameron lê-se a história do seu país, saberia que o Reino Unido entrou de forma pragmática nas Comunidades Europeias em 1973 (após pedido em 1971). O pedido vem depois dos parcos resultados da European Free Trade Assossiation (EFTA), criada precisamente pelo Reino Unido, em concorrência com a Comunidade Económica Europeia. Saberia também que o interesse nacional marcado pelo seu país resultou no famosíssimo rebate da Política Agrícola Comum, de Thatcher (“I want my money back”) e no estatuto especial do Reino Unido na União. Também se lembraria das consequências de anteriores referendos no seu país sobre a permanência na União, como noutros estados europeus sobre questões sensíveis (Tratado Constitucional, caso da Holanda e França). Venceu o não e o Reino Unido saiu. A Política ficou, o sentido de Estado não.

Estes são os termos do populismo: a política do espectáculo, onde as medidas são realizadas com o intuito de melhorar a imagem pessoal do político através de promessas a cumprir com visão de curto prazo, sem orientação de longo prazo. É plantar uma árvore, ter discursos contra a imigração, ou criar empregos não por causa do bem social, mas de forma selectiva a quem lhe possa melhorar a posição social e eleger para mais um mandato. A Europa ficou refém do populismo, e agora na França, Holanda e Itália querem fazer-se referendos em relação à permanência na União e na Zona Euro. As respostas ficarão para dar no futuro.

Eis a nossa realidade, a nossa Europa, onde o individualismo, populismo e a competição económica e social reinam, onde os valores tradicionais de solidariedade e de comunidade perdem-se. O valor do trabalho pela pessoa que o exerce e a estabilidade social para se formar uma família são relegados por valores efémeros, que opõem pares, em busca de virtual eficiência social, económica e cultural. O que as gerações passadas se esforçaram por nos transmitir, por construir e que caberia a nós manter, passámos a esquecer.

O que aconteceu no Reino Unido é uma lição sobre o que devemos evitar. Discursos e medidas dos dirigentes devem ser estudadas e dissecadas, pesar os seus méritos, sancionar ou premiar os seus actos através do voto. Por fim, com o populismo e nacionalismo presentes, podemos ter iniciado o princípio ou fim da Europa, com consequências que não poderemos prever.

Armando Filipe Rodrigues Mateus