ILUMINAÇÃO - As lâmpadas LED têm efeitos nefastos para a saúde (dos humanos e não só) e para o ambiente
Com o fim anunciado das
tradicionais lâmpadas de halogénio, as quais vão deixar os mercados já este
sábado, viramo-nos para a utilização massiva das lâmpadas LED, apresentadas como
o "último grito" da iluminação, mas que agravam a poluição luminosa,
com efeitos nefastos na saúde das pessoas e na vida de animais e plantas.
O retrato é do astrofísico Raul Cerveira Lima,
especialista em poluição luminosa e professor na Escola Superior de Saúde do
Instituto Politécnico do Porto.
“Nunca houve tanta
luz à noite como agora”, afirma à Lusa, acrescentando que as LED brancas,
publicitadas “como o último grito” da iluminação devido à sua maior eficiência
energética quando comparadas com outras luzes, estão a levar ao aumento do seu
consumo.
“Estão a entrar em
massa nas nossas casas e estão a ser postas em massa no exterior”,
assinala. Consequência: “aumento da
poluição luminosa [iluminação excessiva] a grandes distâncias” porque a “luz
branca espalha-se muito mais”.
Segundo Raul Cerveira Lima, as LED brancas, que “simulam o dia”, estão a transformar a “paisagem noturna” e a ser instaladas “sem qualquer ponderação sobre os seus
efeitos” na saúde humana, nos ecossistemas e no ambiente.
Um
desses efeitos, salienta, é a perturbação no sono.
A luz LED branca tem na sua composição um comprimento de
onda azul muito pronunciado que, explica, agrava, quando comparada com outras
luzes, a redução da produção de melatonina, a hormona do sono que é
desencadeada à medida que escurece o dia. A privação do sono pode aumentar o
risco de depressão, obesidade, diabetes e potenciar o cancro de origem hormonal
(cancro da mama e da próstata).
Em experiências de laboratório, realça Raul Cerveira
Lima, o cancro da mama “evoluiu muito
mais rapidamente” nos ratinhos que estavam expostos a luz LED branca.
Nas aves migratórias, o excesso de iluminação exterior,
potenciado por estas luzes, está desorientá-las e a encandeá-las.
“Morrem aos
milhões em países como os Estados Unidos e o Canadá por desorientação”,
descreve o docente, que também é membro do Centro de Investigação da Terra e do
Espaço e do Observatório Geofísico e Astronómico, ambos da Universidade de
Coimbra.
A Alemanha, conta, reduziu a iluminação pública porque o
número de insetos estava a diminuir, um facto “inexplicável só pelo uso de pesticidas”. As aranhas “beneficiam temporariamente” da luz
artificial, que atrai presas como os insetos.
As lâmpadas LED brancas dão mais luz, duram mais tempo e
reduzem os custos com a fatura da eletricidade, face a outro tipo de lâmpadas,
como as de halogéneo, conhecidas pela sua forma de pera ou vela e cuja venda
passa a estar proibida a partir de sábado.
Contudo, avisa Raul Cerveira Lima, a luminosidade por
elas difundida afeta também a vida de espécies como os pirilampos, que “não conseguem comunicar” através da luz
fosforescente que emitem naturalmente devido ao excesso de luz artificial, e
das plantas, que não têm “descanso
noturno” e crescem de dia e de noite.
“Nas árvores das
grandes cidades é visível ainda no inverno a persistência de algumas folhas em
ramos próximos de candeeiros”, refere.
A estes efeitos, o especialista acrescenta o desperdício
de energia e a emissão de mais dióxido de carbono para a atmosfera, uma vez que
“a tendência tem sido pôr mais luz LED
branca” nas ruas, em substituição da luz alaranjada das lâmpadas de vapor
de sódio, porque “é mais económica”.
“Está-se
a gastar mais do que o necessário”, aponta.
Por outro lado, mais iluminação pública significa menos
estrelas no céu observáveis.
“Até aos anos 80
via-se a Via Láctea no Porto, que é [agora] umas das cidades com maior poluição
luminosa em Portugal”, diz, frisando que “todo o norte litoral é uma fonte extrema de poluição luminosa
constatável por imagens de satélite”.
Como solução, Raul Cerveira Lima sugere o uso em casa ou
na rua das lâmpadas LED âmbar ou LED PC âmbar, de cor amarelo-alaranjada, que,
apesar de serem “ligeiramente mais caras
e menos eficientes” do que as lâmpadas LED brancas, “não têm os seus impactos”.
O investigador defende ainda a diminuição da iluminação
pública.
“Portugal é um dos
países da Europa com mais poluição luminosa e um dos países onde a poluição
luminosa mais tem crescido”, assinala, enumerando como razões o uso
acrescido de lâmpadas LED brancas e a “falta
de regulamentação” que defina os limites para a iluminação excessiva.
“Qualquer pessoa,
qualquer município pode colocar a quantidade de luz que quiser, não há qualquer
limite legal. Isso é dramático”, sustenta o investigador, considerando que
a “iluminação pública é exageradíssima
em Portugal”, com “valores que podem
ser três ou quatro vezes superiores aos que se usa na Alemanha, na Suíça e em
França para um passeio ou uma rua”.
Em França, relata, os ecrãs publicitários têm de estar
desligados entre a 01:00 e as 06:00 e há vilas sem iluminação exterior a partir
de certa hora da noite para se poder ver as estrelas.
“Nalguns locais de
Madrid e Barcelona [Espanha] tudo tem de estar desligado a partir das 22:00”,
acrescenta. Em Berlim, na Alemanha, “ainda
se vê a Via Láctea”.
Raul Cerveira Lima apela ao “bom senso na utilização da luz”, lamentando que se esteja “a aceitar em Portugal, sem qualquer
discussão pública, a transformação da paisagem noturna, cujos efeitos vão ser
por anos, provavelmente décadas, e com consequências imprevisíveis”.
O especialista recorda que “a própria indústria reconhece alguns efeitos” da luz LED branca,
com “vários fabricantes a suprimirem”
a componente azul do seu espetro nos ecrãs de telemóveis e computadores.
À tese de que mais luz nas ruas traz mais segurança,
Cerveira Lima contra-argumenta que muitas vezes os condutores se esquecem de
ligar os faróis dos carros, pondo em perigo os peões, devido ao excesso de
iluminação nas estradas, sobretudo nas cidades.
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