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EUTANÁSIA - As cinco propostas que o Parlamento vai decidir





Na próxima quinta-feira, cinco partidos apresentam projetos de lei para descriminalizar a morte assistida em Portugal.

Christiana Martins – Jornalista do Expresso

Os cinco projetos de lei são do Partido Socialista, do Bloco de Esquerda, do Partido Pessoas Animais Natureza (PAN), do Partido Ecologista os Verdes (PEV) e da Iniciativa Liberal. Apresentamos, para cada um deles, a formulação geral em si, quem pode fazer o pedido de morte assistida, como o pode fazer, os prazos para o fazer, os locais onde a eutanásia pode acontecer e quem faz o acompanhamento.

Partido Socialista

Os socialistas são os únicos a utilizar a palavra eutanásia no título da proposta, mas revelam-se cautelosos na exposição de motivos. Antecipando a contestação sobre a constitucionalidade, o PS justifica logo à partida que “não se trata da afirmação de qualquer direito constitucional à eutanásia, mas do reconhecimento legal” da possibilidade de uma pessoa dispor da própria morte em circunstâncias especiais. E embora assumam que o direito à vida goza de dever de proteção por parte do Estado, salvaguardando o indivíduo de ameaças de terceiros, os socialistas defendem que os cidadãos têm de ter “um espaço legalmente reconhecido de decisão quanto à sua própria morte”.

QUEM PODE PEDIR
A própria pessoa que deseja antecipar a morte, desde que seja um português ou alguém a residir legalmente em território nacional, maior de idade, e se encontre em “situação de sofrimento extremo, com lesão definitiva ou doença incurável e fatal”.

COMO PEDIR
Através de um processo de seis fases. O primeiro passo é a abertura pelo doente de procedimento clínico, através da redação de um documento escrito, datado e assinado pelo próprio, dirigido a um médico escolhido pelo próprio candidato, que pode, ou não, ser ou ter sido seu médico pessoal ou de família e que pode, ou não, ser especialista da patologia que afeta o doente. Se aceite, segue-se a consulta a um especialista, cujo parecer deve confirmar se estão reunidas as condições para avançar. O relatório deste segundo clínico deve incluir o diagnóstico e o prognóstico e a natureza incurável da doença ou a condição definitiva da lesão. Um psiquiatra será obrigatoriamente ouvido apenas se alguns dos médicos envolvidos no processo tiver dúvidas se o candidato tem alguma perturbação psíquica que afete a sua capacidade de tomar decisões. Se as dúvidas se confirmarem, o processo é cancelado.

QUAIS OS PRAZOS
Se não houver objeções, o primeiro médico deve elaborar no prazo máximo de cinco dias um registo clínico para a Comissão de Verificação e Avaliação do Procedimento Clínico de Antecipação da Morte, organismo que funcionará no âmbito da Assembleia da República e cujos membros — dois juristas, um médico, um enfermeiro e um especialista em bioética — não serão remunerados e terão mandatos de cinco anos, renováveis apenas uma vez. Se a comissão concordar com o pedido, combina-se com o doente o dia, hora e local e o método para antecipar a morte. Na data marcada, o doente é questionado uma última vez pelo médico, imediatamente antes do ato, “na presença de uma ou mais testemunhas”, se mantém a sua vontade.

ONDE PODE ACONTECER A MORTE ASSISTIDA
No domicílio do doente ou noutro local por ele indicado, desde que o médico que o acompanha considere existirem condições de conforto e higiene adequadas.

QUEM PODE EFETUÁ-LA
Profissionais de Saúde inscritos na Ordem dos Médicos e na Ordem dos Enfermeiros podem realizar o ato, desde que sob supervisão médica. Se algum não quiser participar, deve comunicar ao doente num prazo máximo de 24 horas e explicar as razões de se negar.

Bloco de Esquerda

Antecipação da morte é o conceito que prefere usar no título do projeto o partido que mais se tem batido pela descriminalização da eutanásia em Portugal. O Bloco afirma no preâmbulo do texto que “confundir a proteção constitucional e legal do direito à vida com a fixação de uma obrigação de viver em qualquer circunstância significa impor a todos/as a desumana aceitação de um sofrimento inútil e que agride a dignidade que muitos/as querem que persista até ao último momento da sua vida”.

QUEM PODE PEDIR
O candidato tem de ser maior de idade, capaz de entender o sentido e o alcance do pedido e estar consciente no momento da sua formulação. Tem de sofrer de lesão definitiva ou doença incurável e fatal e estar em sofrimento duradouro e insuportável.

COMO PEDIR
O doente deve elaborar um documento escrito, datado e assinado pelo próprio, que será dirigido a um médico por ele escolhido e que passa a ser o responsável pelo processo. Este médido pode, ou não, ser o clínico pessoal ou de família do doente e pode, ou não, ser especialista na patologia que o afeta. Este médico verifica se o candidato cumpre os requisitos, presta-lhe toda a informação sobre a sua situação clínica e sobre o seu prognóstico, os tratamentos aplicáveis, a existência de cuidados paliativos e, se o doente reiterar a vontade de morrer, deve encaminhar o caso para um especialista, a quem cabe confirmar todos os pressupostos reunidos. Como os socialistas, o Bloco só propõe o recurso a um psiquiatra se houver dúvidas quanto à situação psicológica do doente. Tudo verificado, o processo segue para a Comissão de Avaliação, com a mesma composição e regime de funcionamento avançados pelos socialistas. Este órgão tem 24 horas para emitir um parecer.

QUAIS OS PRAZOS
Se não houver qualquer parecer desfavorável, o doente deve ser informado sobre os métodos disponíveis para realizar o procedimento e escolher uma data. No dia, volta a ser inquirido sobre a sua decisão.

ONDE PODE ACONTECER A MORTE ASSISTIDA
O procedimento pode acontecer em estabelecimentos do Serviço Nacional de Saúde ou privados, desde que disponham de internamento e de local adequado e com acesso reservado. Também pode ocorrer na casa do doente, desde que as condições sejam aprovadas pelo médico responsável.

QUEM PODE APLICÁ-LA
Proposta idêntica à dos socialistas.

Partido Pessoas Animais Natureza (PAN)

É o projeto com o mais longo texto introdutório, recheado de citações de autores de várias origens e épocas. Pode ser resumido pelo parágrafo final, em que o partido recorre a um deputado francês, segundo o qual, a propósito da reforma do Código Penal daquele país (onde a eutanásia não foi descriminalizada), “o indivíduo não deve acabar como carne de laboratório, irrigado, desintoxicado, bombeado para uma máquina”. Devendo, por isso, “admitir-se um direito de viver com dignidade a sua própria morte”.

QUEM PODE PEDIR
Portugueses ou residentes no país, maiores de idade, portadores de doença ou lesão incurável, causadora de sofrimento físico ou psicológico intenso, persistente e não debelado ou atenuado para níveis suportáveis. Ou ainda casos de situação clínica de incapacidade ou dependência absoluta ou definitiva. >Ficam excluídos à partida portadores de anomalia psíquica ou pessoas que padeçam de doenças do foro mental.

COMO PEDIR
O doente deve escolher um clínico assistente, de preferência o seu médico de família ou que faça o seu acompanhamento em sede hospitalar ou de cuidados paliativos. Deve fazer o pedido por escrito e assiná-lo à frente do médico. Este profissional de saúde deve prestar todos os esclarecimentos ao doente sobre o seu estado de saúde e a sua expectativa de vida. Segue-se a consulta a um especialista na patologia em causa. O primeiro médico deve, salvo oposição do doente, discutir o pedido com o agregado familiar. Estas informações devem ser prestadas em conversa, o número razoável de vezes, sem que o partido as quantifique. O PAN exige a consulta de um psiquiatra, sem que seja necessária a existência de dúvidas sobre a situação psicológica do candidato. Reunidas as condições, o médico assistente deve remeter toda a informação no prazo máximo de 15 dias à Comissão de Controlo e Avaliação da Aplicação da Lei, com a mesma composição proposta por socialistas e bloquistas. A comissão tem então cinco dias para verificar se todos os requisitos foram cumpridos.

QUAIS OS PRAZOS
No caso de haver algum parecer desfavorável, o doente tem 30 dias para pedir uma única nova avaliação, que será feita por outro médico, embora com a mesma especialização do anterior.

ONDE PODE SER EFETUADA A MORTE ASSISTIDA
Nos hospitais públicos ou privados ou na casa do doente ou noutro local por ele escolhido, desde que aprovado pelo médico que o acompanha.

QUEM PODE EFETUÁ-LA
Médicos ou enfermeiros inscritos nas respetivas ordens. Os enfermeiros terão sempre de ter supervisão médica para efetuar o procedimento.

Partido Ecologista os Verdes (PEV)

É o mesmo projeto apresentado em 2018. Baseia a sua argumentação numa dúvida: “Deverá o Estado determinar que uma pessoa nesta condição [doença sem cura, irreversível e fatal, causadora de um sofrimento intolerável] perde a sua autonomia, a sua dignidade, a sua liberdade de decidir sobre si mesma e sobre a sua própria vida, obrigando-a a sofrer atrozmente quando não existe outra solução?”

QUEM PODE PEDIR
Pessoas com nacionalidade portuguesa ou residência legal no país, maiores de idade, conscientes, esclarecidas e informadas, que não sofram de doença mental ou psíquica e estejam em profundo sofrimento decorrente de doença grave, incurável, sem expectável esperança de melhoria clínica, encontrando-se em estado terminal ou com lesão amplamente incapacitante e definitiva e em tratamento em estabelecimento do Serviço Nacional de Saúde.

COMO PEDIR
Por escrito, mediante o preenchimento de um formulário disponibilizado pelo estabelecimento do Serviço Nacional de Saúde. O relatório elaborado pelo médico titular será apresentado a uma Comissão de Certificação. O projeto prevê a criação deste organismo em cada área de Administração Regional de Saúde. As comissões serão compostas por sete membros, sendo três médicos, dois enfermeiros e dois juristas, com mais de dez anos de exercício profissional nas respetivas áreas. Se considerar necessário, a comissão pode pedir outros relatórios de avaliação médica da situação do doente.

QUAIS OS PRAZOS
O pedido tem de ser reiterado quatro vezes ao longo do processo. Após a reiteração do pedido pelo doente e deliberação favorável pela comissão, o médico titular marca a data e a hora para a concretização da morte medicamente assistida.

ONDE PODE SER EFETUADA A MORTE ASSISTIDA
A morte medicamente assistida só pode ser realizada num estabelecimento de saúde pública do Serviço Nacional de Saúde.

QUEM PODE EFETUÁ-LA
Um médico ou o próprio doente, sob vigilância médica. Além da presença obrigatória do médico titular e de outros profissionais de saúde que o auxiliam, é ao doente que compete escolher as pessoas que pretende que assistam ao momento da morte assistida, respeitando o número limite definido pela direção do estabelecimento de saúde onde o ato é praticado.

Iniciativa Liberal

Acima de tudo, a liberdade individual, defende o novo partido do Parlamento. “Numa sociedade caracterizada pelo respeito perante a vontade dos seus cidadãos, será sempre inadmissível tratar a antecipação da morte medicamente assistida como uma questão pública”, pode ler-se no texto introdutório do projeto de lei.

QUEM PODE PEDIR
Cidadãos portugueses, residentes legais ou apátridas, maiores de idade, capazes de entender o sentido e o alcance do pedido e que estejam conscientes no momento da sua formulação e que tenham uma lesão definitiva ou doença incurável e fatal, que estejam em sofrimento duradouro e insuportável. Os portadores de perturbações psíquicas estão excluídos.

COMO PEDIR
Através de um pedido dirigido ao médico escolhido pelo doente, que pode, ou não, ser o médico de família ou um especialista na patologia em causa. Depois de se apresentar ao médico e de receber esclarecimentos clínicos sobre a sua situação, o candidato terá de passar por, “pelo menos”, três dias de reflexão, durante a qual terá de receber tratamento psicológico obrigatório. Em caso de parecer favorável, o doente terá de reiterar por escrito a sua vontade e, a seguir, ser encaminhado para um médico especialista. Só será pedido um parecer de um psiquiatra se algum dos dois clínicos anteriores tiverem dúvidas sobre as capacidades psíquicas do candidato. Se não houver opiniões negativas, o dossier completo será enviado à Comissão de Avaliação dos Procedimentos de Antecipação da Morte, que terá oito dias úteis para se pronunciar. Composta por dois juristas, um médico, um enfermeiro e um especialista em ética, a comissão funciona no âmbito parlamentar.

QUAIS OS PRAZOS
Se houver parecer favorável da comissão, avança-se para o agendamento do procedimento. Entre a definição da data e a administração do fármaco letal tem de decorrer novo período de reflexão, desta vez não inferior a dois dias, novamente sujeito a acompanhamento psicológico.

ONDE PODE SER EFETUADA A MORTE ASSISTIDA
Em estabelecimentos de saúde públicos ou privados e, por vontade do doente, o procedimento pode acontecer no seu domicílio ou noutro local por ele indicado, “com exceção de locais públicos ou de acesso ao público”.

QUEM PODE EFETUÁ-LA
Médicos inscritos na Ordem.



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