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EDITORIAL - Do ‘para as pessoas’ ao ‘com as pessoas’


Afirmar que Penacova é um território de baixa densidade populacional, com um crescente problema de diminuição de população e de acelerado envelhecimento da mesma constitui uma banalidade. Tornar esta a Questão concelhia é uma opção de uma amplitude mais complexa e carente de fundamentação científica, para se atualizar numa consequente decisão política, sempre em sentido forte [diferente de partidarismo].

Respondemos habitualmente a esta problemática com melhoria de infra estruturas, apoio à natalidade e atração de emprego. Ninguém discutirá o acerto das medidas. Ainda assim, pode permanecer a interrogação de fundo se se trata de um ‘pacote’ avulso, mesmo que bom, ou de uma ‘parte’ conectada intrinsecamente com o ‘todo’ de um projeto de uma Ideia de território [a médio/longo prazo]. Se assim não for, as infra estruturas podem ser para ‘ninguém’ [porque os de fora não regressam todos os dias!], o apoio à natalidade pode converter-se em sensibilidade simpática residual e o [eventual] ‘não emprego’ responsabilidade dos ‘privados’ que não vieram e/ou não investiram, mesmo se convidados para tal.

Uma nota de destaque para o importante relevo do turismo, mas, regionalismos à parte, os ‘viajadores habituais’ que se perguntem quantos dias costumam permanecer num [outro] lugar como Penacova. O exotismo da experiência do deslumbramento paisagístico dará para quantos dias e será para repetir quantas vezes? É inegavelmente bom e necessário, mas talvez seja periclitante e inconsistente tornar a atratividade turística nuclear e, sobretudo, ‘pensá-la’ de modo estanque.

O centro do argumento onde quero cimentar uma breve reflexão intuitiva sobre a demografia sintetizo-o no conceito de orgânico e no desafio a refletir de maneira sistémica. Ou seja, o concelho é um grande organismo vivo, onde cada elemento vale [mais] na medida em que é parte, de direito e de facto, de um corpo. O contrário é um pensamento minifundiário, onde se guerreia pelos ‘marcos divisórios’ e pelas ‘horas de rega’, para usar uma semântica agrícola reconhecível.

Um primeiro alicerce teórico de fundamentação desta tese é de ordem geo-socio-cultural. O concelho de Penacova pode ser ‘vendável’, na escala e na proporção, mais como ‘área metropolitana’ de Coimbra e menos como Pinhal Interior. Lousã e Miranda do Corvo, por exemplo e para comparar o comparável, sustentaram há umas décadas a narrativa de serem ‘dormitório’ de Coimbra como alavanca para o seu crescimento, levantando a ‘bandeira’ [ainda não concretizada] da acessibilidade fácil e económica. O Centro Hospitalar Universitário de Coimbra, a Universidade e o Instituto Politécnico, pelo menos, são três geradores de mobilidade humana da qual Penacova tem de beneficiar. Alojamento a familiares de doentes deslocados ou para convalescença destes; residências protocoladas de estudantes do ensino superior; efetivação de investigação académica ‘laboratorial’ no território concelhio; colocação do Mosteiro de Lorvão e da gastronomia concelhia na ‘rota’ dos operadores turísticos de Coimbra; residências artísticas, eventos científicos e festivais culturais… Outros fóruns e outras competências podem acrescentar, contraditar e [des]efetivar.

[Re]pensar a demografia e torna-la a Questão, implica certamente colocar as pessoas como prioridade. E, sem chauvinismos, os de cá, antes de mais! Porque são os de sempre! E as pessoas não são simples destinatários dos projetos, para os aplaudir ou criticar como público extrínseco. Não são meros colaboradores, muletas e andaimes, dos que possuem qualquer tipo de poder, para os acolitar nas suas liturgias públicas e secundar as suas posições como inevitabilidades sem contraditório. As pessoas precisam de ser protagonistas, respeitadas como sujeitos e promovidas como parte sem a qual o todo pode prosseguir, ainda que menos enriquecido.

Olhar o nosso território e rotulá-lo de envelhecido, à luz da frieza estatística, tem de equivaler a não considerar isso um problema em si mesmo. Velhos é o que todos queremos e desejamos ser! Logo, sendo um anseio tão genérico, tem de ser algo bom e valorizado. Talvez se possa adaptar a máxima de Baden Powell, fundador mundial do escutismo, quando, em sede de acampamento, diante da necessidade de responder a um problema daqueles que a vida espontaneamente faz acontecer, avançava com uma curiosa chave de solução: «pergunta ao rapaz»! Simetricamente, «pergunta ao mais velho» pode ser uma dinâmica social capaz de gerar a participação integrada das pessoas mais velhas, ao invés de fazer delas figurantes da sua própria existência. O envelhecimento não é assunto das IPSS’s, da Segurança Social ou dos Centros de Saúde, sem o ser das Escolas! É sempre educação e cultura a alavanca de um progresso realmente humano.

Avaliar um espaço geográfico como de baixa densidade, com insuficiente índice de natalidade, conduz espontaneamente o pensamento para a atração de pessoas. Turismo à parte, é desejável que essa capacidade magnética seja perene, nomeadamente para que se gere riqueza e se incremente o emprego. O paradigma do acolhimento tem então de ser o do hospitalidade. Para o hóspede, o melhor. Não podemos desfazer-nos em amabilidade com o turista e não escancarar as portas ao investidor, com uma máquina burocrática que não agiliza a comunicação e não galga etapas. E, tal como há alguém que se especializa em ‘vender’ turisticamente o território, tem de existir outro alguém focado em ‘vender’ o mesmo espaço sob o ponto de vista empresarial e de investimento. 

Quiçá a começar pela diáspora penacovense espalhada pelo mundo, aproveitando [finalmente] de modo orgânico e inteligente a Emigração [como operacionalizar localmente o recente estatuto de ‘investidor na diáspora’?] e incrementando Casas do Concelho noutros pontos de Portugal e do Mundo.

As pessoas estarão no centro se existir um permanente e criativo dinamismo de convocação. Ficar na expetativa da adesão, com a simples abertura de portas e a divulgação de uma ideia não basta para gerar participação. Convocar é provocar. Fazer para as pessoas é distinto de fazer com as pessoas. Perguntar, ouvir a resposta e ser consequente com o que se ouve é a tríade para um itinerário.
Gerar pertença, com comunicação e mobilidade, com elementos agregadores, com entrelaçamento de experiências que gerem mestiçagem cultural é um projeto de longo prazo, que não se inaugura com decretos. Porque tem de estar tudo concentrado numa parte do corpo ou porque têm de ter tudo todas as partes do corpo? Se dividirmos em quatro partes o território, podemos concentrar privilegiadamente os ‘serviços centrais’ num local [Penacova], a dinâmica cultural noutro [Lorvão], a saúde noutro [S. Pedro de Alva] e a ação social noutro [Carvalho]. A divisão é meramente exemplificativa, mas creio que a pergunta que a antecede encerra pertinência.

Por último, fazer da demografia a Questão implica fazer da mobilidade de transportes uma prioridade. Sem acessibilidade não há conhecimento. Sem este não há relação. Sem esta o indivíduo encolhe-se e nesse encolhimento o território encurta. É de rede orgânica que se trata. As crianças e jovens das escolas são netas dos utentes das IPSS’s. Os alunos dos estabelecimentos de ensino são o foco das associações culturais e desportivas… Dispensa-se a exaustividade.

O território alimenta-se de pessoas, não existe apenas para elas.

Luís Francisco Marques



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