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OPINIÃO - Great f***king job, Britain - 24 de Junho de 2016, um dia histórico pelos piores motivos


O Reino Unido está fora da União Europeia. Todas as sondagens se mostraram erradas uma vez mais e a Europa acorda hoje com uma estrela a menos na sua bandeira.

É com genuína tristeza que recebo esta notícia e peço desde já desculpa aos meus leitores se a escrita não for tão escorreita como o habitual.

Que ninguém se engane: o Brexit não vai ser bom para ninguém.

Vamos olhar primeiro para o Reino Unido. As consequências não se fizeram esperar: o Primeiro-Ministro Inglês acabou há minutos o seu discurso de demissão e a Libra já alcançou mínimos históricos. Mas isto é só o início. A Escócia (61,9% contra 38,1%) e a Irlanda do Norte (55,8% contra 44,2%) votaram pela permanência. A independência é o passo seguinte. O País de Gales vai aproveitar a boleia e o Reino Unido desaparecerá.              

O que fica para trás é uma triste versão de um país que outrora liderou a Europa durante a sua fase mais negra. Com David Cameron de fora e Jeremy Corbyn enfraquecido, a nova liderança sairá dos “vencedores” desta madrugada, os mesmos que fizeram disto uma guerra contra a Europa e os migrantes, uma campanha de ódio e medo apoiada pelos famosos tabloides, nomeadamente o the Sun e o Telegraph. Gente que vive de nacionalismos bacocos e ilusões imperiais, que enche os ouvidos do povo com promessas de um futuro dourado com casas mais baratas e sem imigrantes que lhes tirem os empregos.

E o povo foi na cantiga.

E o que lhes espera na realidade? Eu aposto no colapso financeiro.

Se há algo que mostra a estupidez quase cómica de toda esta situação é o seguinte: não há, nem nunca houve durante a campanha um momento em que alguém fizesse a questão mais óbvia: então e depois da saída? Qual será a posição do Reino Unido quanto à Europa? O que fazer com todos os cidadãos europeus que vivem e trabalham no território? Essas perguntas surgem agora e as respostas não são animadoras. A Grã-Bretanha acabou de votar a sua saída do maior mercado único do mundo. Dezenas de novos acordos comerciais terão de ser negociados de raiz, não só dentro do espaço europeu mas também todos aqueles de que a Europa - da qual a Grã-Bretanha fazia parte - tinha com o resto do mundo. Isto para não falar em todas as questões legais, cooperação policial, controlo de fronteiras… enfim, um oceano de burocracia, um pesadelo Kafkiano.

Mas que se lixe, têm dois anos para negociar isso. Uma coisa de cada vez, não é?

Mais. O sistema britânico é especialmente dependente de trabalhadores europeus. Veja-se o caso dos enfermeiros portugueses. São milhares de trabalhadores que vão ficar na expectativa enquanto a Libra perde valor e a bolsa se afunda. O que farão estas pessoas? Eu sei que eu não ficava lá para ver.

É esta a categoria de governantes a que o povo britânico vai ser sujeito. Se David Cameron é o principal responsável por esta situação, quem quer que seja que venha a seguir não será melhor. A não ser que Corbyn consiga um milagre.

Então e a Europa? Como já vi pelo facebook logo pela manhã, a mensagem não podia ser mais clara: Reforma-te ou Morre.

O desfecho deste processo tem de servir para uma mudança de paradigma. A Europa tem de voltar ao espírito da sua formação e construir a partir daí. Os nossos esforços devem ser no sentido de abertura e de cooperação e não no fecho de fronteiras. A saída da Grã-Bretanha da Europa representa um retrocesso de décadas no sentido daquilo que deveria ser a visão colectiva do mundo.

Não deixa de ser curioso que tenham sido partidos que se destacam pelo conservadorismo ideológico e pelo liberalismo económico a defender o afastamento de uma Europa dominada pelo Partido Popular Europeu, um partido de centro-direita. Aqui está o resultado da ditadura dos “mercados”.

Os movimentos nacionalistas de quase todos os países europeus acordaram com este resultado, clamando por referendos nos seus feudos. As mensagens dos seus lideres são semelhantes: vamos recuperar a nossa economia e a nossa soberania, vamos travar a islamização. Já ouvi isto nalgum lado, mas ia jurar que da última vez era contra os judeus.

Hoje, a minha confiança na Democracia atingiu mínimos históricos.      

                                                                                                                                                                 Rui Sancho