CRÓNICA - Envelhecimento, Como?
Seja
qual for o mecanismo e o tempo do envelhecimento celular e embora haja
correlação entre o número possível de
duplicações das células e a longevidade máxima da espécie a que
pertencem, o envelhecimento não atinge simultaneamente todas as células e
consequentemente todos os tecidos, órgãos e sistemas. A claudicação funcional
resultante da diminuição orgânica é igualmente assíncrona: mínima para a
homeostase glicémica, a falência atinge o seu máximo no respeitante à capacidade respiratória que
assim constituiria a determinante
fisiológica da longevidade máxima.
Tendo
cada sistema o seu tempo de envelhecimento, mesmo sem a interferência dos
factores ambientais, tal facto tem implicações que se tornam mais visíveis quando
o organismo é agredido pela doença. A diminuição da função renal- de cerca de
50% aos 80 anos, condiciona fortemente a farmacoterapia do idoso; as alterações
orgânicas a nível das mucosas digestivas são determinante frequentes de
problemas nutricionais; as alterações da arquitectura do osso e a dismetabolia
cálcica propiciam fracturas frequentes; a diminuição da água intracelular- perda de 10 a 15% aos
oitenta anos, torna o idoso extremamente sensível aos desequilíbrios
hidro-electrolíticos, o que é agravado pela diminuição da sensação de sede; o
aumento da massa gorda favorece a obesidade com todo o seu conjunto de
consequências.
Para
além de todas as diminuições orgânicas e funcionais, que originam
significativas alterações na forma e na composição corporal com o passar dos
anos, talvez as condições mais relevantes a ter em consideração para a
sobrevivência do idoso e para a sua qualidade de vida sejam no entanto, a diminuição da sua reserva fisiológica e
a consequente dificuldade na reposição
do seu equilíbrio homeostático quando alterado. Não ter estas duas alterações sempre
presentes no lidar diário com os mais velhos, pode ser a diferença entre a vida
e a morte.
As
considerações feitas até aqui, referentes às modificações físicas determinadas
pelo envelhecimento, são igualmente aplicáveis ao envelhecimento mental.
As
alterações orgânicas verificadas no sistema nervoso, fundamentalmente o
envelhecimento e a perda dos neurónios substituídos por tecido glial, a
diminuição do débito sanguíneo com a consequente diminuição da extracção da
glicose e do transporte do oxigénio e a diminuição de neuromediadores,
condicionam a lentificação dos processos mentais e as alterações da memória, da
atenção e concentração, da inteligência e do pensamento. As diminuições
referidas não comprometem significativamente o desempenho do idoso, em
condições normais. Mantém-se as capacidades verbais e de cálculo e aritmética,
a orientação, a memória remota, a inteligência cristalizada, as emoções, a
personalidade.
O
idoso supera a diminuição mental como a física, se elas não forem agravadas
pela doença ou pelas agressões ambientais e sociais. A actividade intelectual e
o exercício físico, o controlo da doença, a vida social e familiar favoráveis,
permitem ao idoso ultrapassar as dificuldades de um envelhecimento normal e
manter a autonomia e a qualidade de vida.
Num
percurso de vida que teoricamente se estende até aos 120 anos, o homem cresce,
amadurece e envelhece.
Processo
contínuo e irreversível, o envelhecimento normal traz consigo a diminuição
física, mental e social consequente das alterações estruturais e funcionais que
experimenta no corpo e na mente. E que não podendo ser evitadas podem ser
minimizadas e proteladas.
Porventura
inscrito no genoma, o tempo de vida que é dado ao homem viver terá a marca que
cada um quiser ou puder imprimir.
Aceitar
o envelhecimento, assumi-lo nas suas grandezas e misérias, viver com ele, é
provavelmente a maior tarefa que o homem enfrenta.
E
nesta aceitação do envelhecimento, cada um de nós deverá ter sempre presente o
que são os grandes problemas do idoso
e quais os objectivos dos cuidados aos
idosos.
No
respeitante aos grandes problemas do
idoso, temos a solidão (perda de contactos sociais e familiares), a
carência de recursos (sócio-económicos);
as doenças(Crónica, acidente, demência) e a perda da autonomia(incapacidade e
dependência). E no que concerne aos
objectivos dos cuidados aos idosos, temos a mobilização de todos os
recursos possíveis para manter na família e na comunidade, com autonomia e
qualidade de vida, o maior número de idosos; valorização de todas as
capacidades do idoso no sentido de superar os défices existentes; avaliação dos problemas e necessidades do
idoso com vista a uma assistência integrada e compreensiva; assistência
continuada, no domicílio ou instituição aos idosos inválidos ou com doença
crónica; ensino e formação contínua aos idosos, familiares e profissionais e
promoção da investigação biológica, clinica e social na área do envelhecimento.
E
porque se envelhece cada vez mais tarde e considerando que um grande número de
idosos conserva durante muitos anos razoável estado de saúde e vitalidade, é
crucial encarar o envelhecimento como um processo natural que deve ser vivido
com tranquilidade e de forma bem-sucedida. E por hoje é tudo, termino esta
crónica com um poema de Saúl Dias, “ Nunca
Envelhecerás“.
Nunca Envelhecerás
A
tua cabeleira
é
já grisalha ou mesmo branca?
Para
mim é toda loira
e
circundada de estrelas.
Sobre
ela
o
tempo não poisou
o
inverno dos anos
que
se escoam maldosos
insinuando
rugas, fios brancos...
Ao
teu corpo colou-se
o
vestido de seda,
como
segunda pele;
entre
os seios pequenos
viceja
perene
um
raminho de cravos...
Pétalas
esguias
emolduram-te
os dedos...
E
revoadas de aves
traçam
ao teu redor
volutas
de primavera.
Nunca
envelhecerás na minha lembrança!...
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