CIÊNCIA VIVA - Morcegos são cada vez mais utilizados para controlar pragas agrícolas
Um novo estudo liderado por investigadores do Centro de Ecologia, Evolução e Alterações Ambientais (Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa) demonstra que várias espécies de morcegos estão a providenciar um serviço vital de controle de pragas aos produtores de arroz de Madagáscar, ao banquetearem-se com as pragas de insetos nefastos para a agricultura deste país. Trata-se da primeira evidência de controlo de pragas por morcegos em Madagáscar e, de acordo com os investigadores, irá permitir aliviar a atual pressão financeira que existe sobre os agricultores para converterem florestas em terrenos agrícolas.
Madagáscar é um dos países do mundo onde a
relação entre a agricultura e a conservação é mais tensa. As florestas de
Madagáscar estão a ser convertidas em terrenos agrícolas a uma taxa de 1% por
ano, e grande parte desta destruição é motivada pelo cultivo do arroz, a
principal cultura agrícola do país.
Isto acontece, em parte, porque as pragas de
insetos estão a destruir grandes quantidades deste cereal, o que leva os
agricultores de subsistência a destruir ainda mais florestas para criar novos
arrozais, causando uma perda devastadora de habitats e biodiversidade na ilha.
Mas nem todas as espécies estão a ser prejudicadas – os morcegos são
importantes predadores de insetos, e na verdade algumas espécies de morcegos
insetívoros estão a prosperar na ilha, com importantes implicações para
agricultores e biólogos da conservação.
“Verificámos
que algumas espécies estão a tirar partido da modificação do habitat para
caçarem os insetos que se aglomeram sobre os arrozais do país. Várias destas
espécies são aves e morcegos insetívoros que, através da supressão de pragas
agrícolas, podem fornecer um valioso serviço às populações locais”, explica
Adrià López-Baucells, co-autor deste artigo, estudante de doutoramento no
Centro de Ecologia, Evolução e Alterações Ambientais (cE3c) da Faculdade de
Ciências da Universidade de Lisboa (FCUL).
Para este estudo, publicado na revista
científica Agriculture, Ecosystems and Environment (https://doi.org/10.1016/j.agee.2018.09.027),
os investigadores utilizaram gravadores ultrassónicos de última geração e
técnicas moleculares para analisar a alimentação de morcegos insetívoros nas
paisagens agrícolas de Madagáscar, e registaram os ultrassons produzidos pelos
morcegos para localizar as suas presas. De seguida, os investigadores aplicaram
análises genéticas para analisas amostras fecais de morcegos de várias espécies
capturados em arrozais e florestas próximas.
Os resultados demonstraram que as
seis espécies de morcegos analisadas se alimentam de pragas de insetos com
grande impacto económico: não só pragas que afetam a plantação de arroz como
também outras culturas, como macadâmia, cana-de-açúcar e citrinos.
A eficácia dos morcegos no controle de pragas já foi
comprovada nos Estados Unidos e na Catalunha”, explica James Kemp, primeiro autor do artigo e estudante de doutoramento
no cE3c-FCUL. “O
nosso estudo é o primeiro a demonstrar este resultado em Madagáscar, onde há
muito em jogo para os agricultores e para os biólogos da conservação”,
acrescenta o investigador.
Os morcegos correspondem a cerca de um quinto
de todas as espécies de mamíferos em Madagáscar, e existem trinta e seis
espécies de morcegos que só podem ser encontrados nesta ilha. Este facto torna
Madagáscar uma das regiões mais importantes do mundo para a conservação deste
grupo de animais, que, no entanto, têm uma má reputação no país: para além de
serem vistos como um incómodo, por se empoleirarem nos prédios, são também
frequentemente associados à disseminação de doenças.
No entanto, a população local pode ter mais
um motivo para mudar a sua percepção deste grupo de animais, uma vez que os
investigadores encontraram evidências de que os morcegos em Madagáscar não só
se alimentam de pragas agrícolas como também de mosquitos – vetores de malária,
elefantíase e de outras doenças infecciosas.
Ciência na Imprensa Regional –
Ciência Viva
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